JOSÉ EMÍLIO CARLOS LISBOA
No próximo dia dezessete do corrente mês será inaugurada a nova Cozinha Piloto que receberá o nome da finada enfermeira Jolice de Melo Pedroso.
Jolice é oriunda de uma geração de brasileiros idealistas com elevado nível de politização e humanismo, que acreditava na importância do serviço público como uma das principais ferramentas de promoção do desenvolvimento e justiça social de que o país tanto necessitava.
Foi com esse espírito e formação que se tornou uma líder servidora ao ombrear o serviço de enfermagem de nossa Santa Casa, bem como as demais interfaces transversais que permearam a instituição. Sua devoção ao trabalho era de tal forma que animava as colegas a seguir o seu exemplo. Não era raro permanecer no trabalho por semanas inteiras sem nenhuma folga.
Foi nesse período que a instituição ganhou fama e passou a ser demandada por um público além do local dado o tratamento humanitário que era dispensado aos pacientes.
Quando assumi a prefeitura pela primeira vez, no ano de 1983, formei uma fazenda municipal com alta produção de alimentos naturais, inaugurando o período da fartura na merenda escolar de Angatuba, algo totalmente inédito no âmbito da administração pública dos municípios brasileiros.
Com o mesmo espírito e liderança que tocou a Santa Casa, Jolice tornou-se minha coadjuvante na organização da cozinha piloto da mesma forma que compôs uma competente equipe de funcionários que rapidamente compreendeu a importância de seu papel tanto no preparo da merenda quanto no entendimento da transição que a prefeitura estava vivendo nessa área alimentar de suma importância para a saúde dos alunos das escolas públicas do município. Com esse mesmo espírito, mesmo após o expediente, quando necessário, esses funcionários iam à fazenda municipal para colher frutas, hortaliças, víveres em geral que iriam compor a merenda do dia seguinte.
Pelo fato de ter feito do serviço público uma verdadeira missão de vida, sua atuação não se restringiu somente a esses dois projetos, que indubitavelmente foram os mais relevantes. Foi um dos meus braços direitos durante os meus dezoito anos de mandato, e era um verdadeiro coringa, pois entendia praticamente da natureza de todos os serviços operacionais da prefeitura e os ordenava e os acompanhava com muito zelo e responsabilidade.
Não é novidade dizer que enquanto governei este município, nossos projetos estiveram presentes na maioria páginas da grande imprensa nacional, tanto pela sua inovação quanto pelo seu alcance social. Esse feito não existiria se eu não tivesse tido outros quadros de excelência, a exemplo de Jolice, aos quais tenho imensa gratidão e partilho essa conquista que constitui um marco inapagável da história político-administrativa deste município.
Outra coisa que gostaria de salientar em virtude do intenso convívio que tivemos, é que nossa relação afetiva era muito mais de irmãos do que de amigos propriamente. Por isso passei a conhecer com profundidade sua personalidade e um tanto de sua alma, o que me confere o direito de afirmar de forma peremptória que sua prática de vida esteve muito mais próxima da maneira como os cristãos primitivos viviam, cujo fulcro era a divisão de tudo que possuíam numa vida vivida em comunidade. Jolice nunca pensava em si, sua obsessão era o próximo, a exemplo da segunda lei que Jesus nos ensinou. Passou todo tempo endividada, não que fosse perdulário, mas por conta do tamanho de seu coração que era muito maior do que o valor do salário que recebia.
Para corroborar a importância que Jolice representou para nossa comunidade e expressar sua visão de mundo, gostaria de fazer meus os versos de dois grandes poetas universalmente reconhecidos.
O primeiro foi Bertold Brecht, com o seguinte verso:
Há pessoas que trabalham um dia para o bem comum e são boas
Há outra que trabalham vários dias e são melhores
Há outras que trabalham muitos anos e são ainda melhores
Porém, há aquelas que trabalham a vida inteira
Essas são as imprescindíveis!
Assim foi Jolice para Angatuba em seu tempo: Imprescindível.
Outro poeta se chamava Maiakovski com o seguinte verso:
Comigo a anatomia enlouqueceu
Pois o homem tem um só coração
Mas eu sou todo coração
Assim foi Jolice como ser humano: todo coração.
Da mesma forma como todas as pessoas que nascem neste planeta de expiação não são perfeitas, Jolice também tinha seus defeitos. A diferença é que pertenceu a uma categoria de seres humanos cujas virtudes são incomensuravelmente maior que os defeitos.
Assim foi Jolice!!!!!!!!
Quero parabenizar a exemplar atitude do Sr. prefeito Nicolas ao homenagear uma cidadã angatubense, cuja memória jamais poderia ser apagada, ao conferir seu nome ao novo prédio da Cozinha Piloto.
Como ex prefeito faço coro ao Nicolas pelo seu entendimento republicano de que um prédio público deve levar o nome de um cidadão, cuja vida laboral ou profissional tenha estreita relação com a natureza da atividade a que a obra será destinada.
José Emílio Carlos Lisboa, ex- prefeito de Angatuba (quatro gestões).
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