Quando essa vida ainda não havia começado, existiam somente o céu e a água que o envolvia, e eles eram separados apenas por uma pequena casca. Essa casca recobria o céu e servia de assoalho a seus habitantes, que tinham uma vida plena e farta, pois ali havia de tudo para todos. Mas, fora da casca do céu, existiam coisas ruins, seres atrozes e espíritos maléficos.
A boa humanidade era protegida por Akuanduba e seguia dedicando-se às coisas básicas da vida: acordar, comer, beber, namorar, dormir. Se alguém cometesse algum excesso, contrariando as normas, Akuanduba fazia soar uma flauta, chamando a atenção de todos para que se comportassem conforme a boa ordem.
Houve um dia, no entanto, que ocorreu uma grande briga da qual muita gente participou. A flauta de Akuanduba soou, mas a multidão teimosa não quis parar de brigar. Nessa confusão, a casca do céu se rompeu, lançando tudo e todos para longe, para dentro da água.
Com a queda, todos perderam e todos os velhos e crianças morreram , restando apenas uns poucos homens e mulheres. Dos sobreviventes, alguns foram levados de volta ao céu por pássaros amazônicos, e lá se transformaram em estrelas. Os que ficaram foram abandonados pelos pássaros nos pedaços da casca do céu que caíram sobre as águas. Assim surgiram os Arara, que para se manter afastados das águas, escolheram ocupar o interior da floresta. Assim, aqueles que antes viviam como estrelas tiveram que passar a viver como gente, tendo que perseguir o alimento de cada dia em meio aos perigos, que existem sobre o chão.
Até hoje, os índios Arara, habitantes do vale dos rios Iriri-Xingu, localizado no Estado do Pará, assobiam chamando as araras quando as vêem voando em bandos por sobre a floresta. Quando pousam no alto das árvores, as araras por sua vez, observam os índios e, ao notarem o quanto eles cresceram, desistem de levá-los de volta ao céu. Aqui já foram deixados outras vezes e aqui deverão permanecer.