maio 02, 2022 Air Antunes Artigos 0
SCOTT HAMILTON
O Brasil sabe bem, pela experiência amarga com a ditadura militar, que, quando a democracia morre, é difícil ressuscitá-la. O exemplo global do poder e prestígio democráticos brasileiros tem mais valor hoje como contraponto ao crescente avanço da autocracia pelo mundo do que em qualquer momento na História do país. Mas, em meio a ameaças verossímeis às instituições e valores democráticos no Brasil, os Estados Unidos permanecem passivos diante do público. Seria trágico se compensassem sua errônea e abertamente cômoda identificação anterior com o presidente Jair Bolsonaro escondendo-se agora de modo complacente nas sombras.
Como cônsul-geral no Rio entre 2018 e 2021, testemunhei as formas como Bolsonaro e seus apoiadores tentaram sabotar a integridade do processo democrático brasileiro e suas, em geral, espetaculares instituições democráticas independentes — imprensa, ONGs, TSE, STF e o próprio sistema de votação. A intenção é clara e perigosa: minar a fé do público e preparar o palco para o esforço de recusar-se a aceitar seu resultado. Não tenha dúvida, Bolsonaro se enxerga como um enviado de Deus para salvar o Brasil do “comunismo”. É uma visão messiânica impermeável à razão. A presença de Carlos Bolsonaro, seu líder de campanha nas redes sociais, na delegação que em março encontrou Vladimir Putin, presidente de um país que é um sofisticado manipulador digital de eleições, deveria nos deixar com a pulga atrás da orelha.
Em primeiro lugar, os Estados Unidos deveriam deixar claro de modo cristalino ao presidente Bolsonaro que uma tentativa de interferir na integridade do processo eleitoral brasileiro será objeto de repúdio absoluto e de sanções punitivas a todos os envolvidos, impostas simultaneamente por um amplo grupo de países. Segundo, a administração Biden deveria ser mais agressiva ao apoiar as instituições democráticas independentes do Brasil. Finalmente, por ora, a comunidade diplomática afim deveria adotar atividades públicas similares que deixassem claro seu próprio compromisso com as instituições e valores democráticos.
Com a pressão das crises na Ucrânia e no resto do mundo, seria fácil para os formuladores políticos globais perder de vista a importância vital de um Brasil vibrante, pacífico e democrático, um ativo estratégico poderoso para democratas de todas as partes. Nenhum país se aproxima tanto dos Estados Unidos em tamanho, diversidade, pluralismo, valores e impacto democrático. A hora para os Estados Unidos se manifestarem é agora, não quando uma crise estiver em curso ou depois dela.
Scott Hamilton, aposentado do Departamento de Estados dos Estados Unidos, ex-consul no Rio de Janeiro
Artigo transcrito do jornal O Globo, edição de sábado dia 30 de abril.
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