Um dos principais artífices da vinda da Corte lusitana para o Brasil, d.Rodrigo de Souza Coutinho, conde de Linhares, era um homem atarracado de pele morena e cabelos crespos- diziam até que sangue africano lhe corria pelas veias. Nascido em 1755, de família nobre (o pai foi embaixador e governador de Angola), afilhado do marquês de Pombal, foi o primeiro grande político ilustrado português. Teve uma formação privilegiada: frequentou o Colégio dos Nobres e a Universidade de Coimbra, viajou longamente pela Suíça e França, conheceu alguns dos grandes pensadores do Iluminismo e viu de perto a crise da monarquia diante da onda popular que resultaria na Revolução Francesa. Aos 23 anos, foi nomeado representante diplomático junto à corte da Sardenha, em Turim, regressando a Portugal para assumir o posto do falecido Martinho de Melo e Castro, ministro do Ultramar.
D.Rodrigo defendia a secular aliança com a Inglaterra e era contra a tentativa de aproximação com a França napoleônica, o que o levou a se afastar da vida pública em 1803. De volta em 1807 diante das ameaças de Bonaparte, reconquistou a influência junto a d.João e o convenceu a mudar a Corte para o Brasil. Aqui articulou tratados de 1810 com a Inglaterra e impulsionou a criação do primeiro Banco do Brasil Defendia a idéia de um império luso-brasileiro, espécie de Commonwealth portuguesa, a ser implantada nas quatro partes do mundo, a partir de uma série de reformas políticas, econômicas e administrativas, que expôs detalhadamente na sua Memória sobre o melhoramento dos domínios de Sua majestade na América, apresentada em 1797. “Que artes pode o Brasil desejar por muitos séculos”, escreveu ele, “quando as suas minas de oiro, diamantes, etc., as suas matas e arvoredos para madeiras de construção, as culturas já existentes (….) e as novas culturas (….) lhe prometem juntamente com a extensão da sua navegação uma renda muito superior ao que jamais poderiam esperar das manufaturas e artes, que muito mais em conta por uma política bem entendida podem tirar da metrópole?”
Estas citações às riquezas naturais e exaltações à terra que irão compor o imaginário nacional, eram veiculadas por intelectuais que gravitaram em torno de d. Rodrigo, José Bonifácio e Hipólito José da Costa foram seus contemporâneos- “a geração de 1790”, batizada pelo historiador Kenneth Maxwell.
Estudaram em Coimbra na mesma década e se ligaram a ele quando desempenhava importante papel no governo português, entre o final do século XVIII e o início do XIX. D. Rodrigo reconhecia o Brasil como parte principal do império português e propôs a elevação das capitanias à condição de províncias, com igualdade de direitos e deveres, idéia que seria mais tarde adotada pelo Império brasileiro.
Trabalhador incansável, como enfatizou o historiador Guilherme Pereira das Neves, demonstrou rara sensibilidade para com o problema luso e vislumbrou o Brasil como uma tábua de salvação. No final do século XVIII, o império desmoronava, sem recursos financeiros para preservar sua autonomia. Contra a corrente de idéias tradicionais tentou reorganizar a administração lusa e levar na devida conta o peso do Brasil na comunidade.
No Rio de Janeiro, nomeado ministro da Guerra e Estrangeiros em 1808, aceitou o desafio e enfrentou com grande energia os problemas resultantes da transferência da Corte. D. Rodrigo sofria do coração, tinha vertigens e morreu de repente , em 26 de janeiro de 1812, após desmaiar no palácio durante uma rixa com d. João.
De “A Construção do Brasil”da Prol Editora Gráfica